Inovação Social Corporativa: um novo fator de competitividade empresarial

Inovação Social Corporativa: um novo fator de competitividade empresarial
28 de Março, 2023 gestao

O papel das empresas na sociedade não é um tema novo, nem de simples análise, coexistindo diferentes perspetivas acerca do mesmo.

Por vezes, as empresas são vistas como fonte de impactos sociais negativos, por exemplo através da extração não controlada de recursos naturais, da geração de poluição ou de práticas eticamente reprováveis na relação com os seus trabalhadores.

Por outro lado, encontramos também evidências de reconhecimento do importante contributo que algumas empresas dão para a coesão e desenvolvimento social, como é o caso dos unânimes elogios ao recentemente falecido Comendador Rui Nabeiro e à Delta Cafés.

Em casos como este último, parece dominar a seguinte interpretação: por ter sido capaz de criar valor ao longo do tempo (nomeadamente através do espírito empreendedor do(s) seu(s) responsável(is)), a empresa, imbuída de um espírito altruísta, decidiu “devolver” à sociedade uma parte desse valor.

Ora, a minha pesquisa e experiência levam-me cada vez mais a sugerir uma interpretação alternativa, ou no mínimo complementar: talvez a Delta Cafés (assim como outras) tenha sido capaz de criar mais valor precisamente devido à partilha que foi fazendo com a sociedade ao longo da sua existência.

Não tive, infelizmente, o prazer de conhecer o Sr. Rui Nabeiro, nem conheço a Delta Cafés para além da informação que vou recolhendo em notícias, relatórios ou estudos públicos. Mas atrevo-me a dizer que o sucesso da empresa deriva também, e em relevante medida, das suas práticas de Responsabilidade e Inovação Social Corporativa (RISC). Neste ponto, saliento o conceito e potencial da Inovação Social Corporativa, que se distingue da “mera” Responsabilidade Social Corporativa por traduzir a incorporação do contributo para o bem-estar social em todas as dimensões da estratégia e modelo de negócio da empresa (propósito, objetivos, produtos/serviços, segmentos alvo, relação com o mercado, parcerias, atividades chave, entre outras).

De facto, o que tenho visto e aprendido leva-me a crer cada vez mais que as empresas que, intencionalmente, criam e cultivam relações simbióticas com todos os “stakeholders” dos sistemas onde atuam (incluindo naturalmente fornecedores e clientes, mas também os menos óbvios, como agentes culturais/criativos, ONG, IPSS, e a sociedade em geral) aumentam fortemente a sua capacidade de criar valor económico, sobretudo através dos seguintes mecanismos principais:

– tornam-se mais capazes de inovar, a todos os níveis – produto, processo, marketing e organização; sem prejuízo da importância dos outros, destaco o nível da inovação de produto, que se assume frequentemente como alavanca central de diferenciação empresarial;

– tornam-se mais capazes de atrair novos trabalhadores, mais adequados às suas necessidades, assim como reter, envolver e motivar os que já nelas trabalham;

– tornam-se mais robustas e resilientes face a situações de crise, nomeadamente a partir de relações mais fortes e estáveis com clientes, fornecedores e parceiros (o que muitas vezes significa também custos mais baixos face a outras alternativas);

– criam uma reputação, confiança e notoriedade positivas nas cadeias de valor, comunidades e sociedades onde atuam, o que tem naturalmente impacto na sua competitividade a longo prazo;

Alguém disse que “não existem empresas saudáveis em comunidades doentes”, e a Delta Cafés é um excelente exemplo, entre muitos outros, de que é possível ir mais longe no que respeita ao papel social das empresas, desde logo reenquadrando a questão e compreendendo que a economia e a sociedade não estão separadas, antes a primeira (assim como as empresas) faz parte e depende da segunda.

Muito há a fazer para que esse caminho seja seguido, sendo que me atrevo a identificar 3 desafios (que são também sugestões) particularmente pertinentes:

– capacitar pessoas e organizações nestes temas (incluindo nas instituições de ensino superior), introduzindo e massificando conceitos e ferramentas úteis que possam despoletar mais criação de valor partilhado, para a empresa e para a sociedade;

– desenvolver, aplicar e disseminar mecanismos fiáveis de avaliação do impacto da aposta na Responsabilidade e Inovação Social Corporativa nas empresas e na sociedade;

– reconhecer e valorizar as empresas que, comprovada e eficazmente, praticam Responsabilidade e Inovação Social Corporativa, incentivando também dessa forma que cada vez mais empresas o façam; se muitas empresas beneficiam, através do SIFIDE, de importantes apoios financeiros a atividades de I&D e inovação, porque não, por exemplo, criar um Sistema de Incentivos Financeiros à Inovação Social Corporativa?

Julgo também que este caminho é passível de suscitar um amplo consenso entre diferentes perspetivas sobre a atuação e papel social das empresas, o que constitui um pilar importante para uma ação concreta e eficaz.

Da minha parte, continuarei a pugnar pela disseminação e afirmação de empresas mais responsáveis, inovadoras e criadoras de valor económico e social.

António Luís Ferreira

28 de março de 2023